A construção civil enfrenta seu pior momento em mais de dez anos, depois de um período de crescimento acelerado, em que foi beneficiada pela expansão do crédito e da renda e por programas de investimento do governo.
A alta dos juros, aliada a uma retração dos gastos públicos, abalou a demanda por imóveis e empreendimentos de infraestrutura (veja gráfico abaixo). Nos últimos meses, o quadro foi agravado pela fuga de recursos da poupança, principal fonte de financiamento para moradia.
Neste ano, o PIB do setor vai encolher 5,5%, no pior desempenho desde 2003, projeta Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção da FGV/Ibre. Segundo a economista, a retração, se confirmada, vai gerar uma queda de 0,3 ponto percentual do PIB nacional.
“Com o fim do ciclo de crescimento que teve seu auge em 2012, já haveria um ciclo de ajustes. Com o cenário econômico mais complicado, esse ajuste pode se prolongar.”
Se há pouco mais de um ano a construção civil era vista como um símbolo dos gargalos de crescimento do Brasil, dada a escassez de mão de obra especializada no setor, hoje é um dos setores que lideram as demissões no país.
Nos primeiros três meses do ano, as construtoras cortaram 50 mil vagas formais de trabalho. Em 12 meses, foram 250 mil postos fechados.
No primeiro trimestre, os empréstimos com dinheiro da poupança tiveram a primeira queda para o período desde 2002. A Caixa, maior agente financeiro na área, elevou o percentual de entrada para obtenção desses empréstimos e colocou os clientes interessados em uma fila de espera.
Os juros subiram de 7% para 9% anuais nos últimos dois anos. O valor dos imóveis, que aumentar acima de inflação entre 2006 e 2011, apresentou rentabilidade abaixo do índice de preços ao consumidor nos 12 meses até fevereiro.
RETOMADA
Economistas e construtoras não preveem crescimento das contratações até o fim do ano. A avaliação é que o mercado vai seguir em dificuldade enquanto durar a fase mais austera do ajuste fiscal e monetário do governo.
Depois, é esperada uma retomada dos financiamentos, em ritmo menor que o verificado entre o fim do governo Lula e o início do de Dilma.
“Chegamos ao fundo do poço, mas a tendência é de uma retomada na sequência”, diz José Carlos Martins, presidente da Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), destacando a importância de o governo definir o quanto antes investimentos que pretende fazer no Minha Casa, Minha Vida e também regras para as novas concessões.
O governo deve lançar em julho mais uma etapa do Minha Casa, Minha Vida. Também estão em estudo medidas para destravar financiamentos habitacionais para as classes média e alta.
O diretor-executivo da Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), Renato Ventura, diz que a recuperação vai depender do fim do ajuste promovido pelo governo e da melhora nas condições de crédito e na confiança do consumidor.
“Em algum momento esse ciclo vai se reverter. A demografia do país faz com que seja necessário construir mais imóveis. Tem gente que acha que será no segundo semestre e gente que acha que vai demorar um pouco mais.”
Para Octavio de Lazari Junior, presidente da Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança), o setor não pode ter taxas de crescimento acima de 30% ao ano, com se verificou até 2012.
Uma expansão entre 5% e 10% nesse crédito é algo saudável e suficiente para atender à demanda por imóveis.
Os executivos defendem a adoção de medidas emergenciais, como a liberação de parte do dinheiro da poupança retido no BC (compulsório) e o uso do FGTS para imóveis acima do limite de R$ 190 mil, neste momento mais difícil.
Enquanto isso, esperam mais demissões e redução da oferta de crédito e de imóveis. Descartam, no entanto, uma crise de queda de preços, quebra de empresas ou estouro de inadimplência.