A principal evidência de que o delator Júlio Camargo disse a verdade sobre a reunião que afirma ter tido com o deputado Eduardo Cunha, em 2011 – quando o presidente da Câmara teria exigido a propina de US$ 5 milhões – é o rastreamento das ligações do celular do lobista do PMDB na Petrobras Fernando Falcão Soares, o Fernando Baiano. Os investigadores descobriram que Baiano, braço direito de Cunha, também participou do encontro, no dia 18 de setembro daquele ano, um domingo, segundo Relatório de Análise 89/2015 da Procuradoria-Geral da República.
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O presidente da Câmara foi denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo Ministério Público Federal na quinta-feira (20). Como o deputado nega ter se encontrado com o delator e exigido a propina, a Procuradoria fez um impressionante trabalho de investigação, poucas vezes visto em casos de corrupção. Reconstituiu os passos dos personagens desse capítulo da Lava Jato – Baiano, Cunha e Júlio Camargo. O delator revelou que Cunha e Baiano o encontraram em um prédio comercial do Leblon no Rio, o Leblon Empresarial, situado na Avenida Ataulfo de Paiva.
O local exato da reunião foi uma das salas da empresa SIDUS Consultoria e Pesquisa, no terceiro andar, de propriedade de Sérgio Roberto Wayne, advogado e amigo de Baiano. O endereço se encontra dentro do ângulo de alcance da antena que captou os contatos de Fernando Baiano.
Segundo a Procuradoria, Fernando Baiano tinha as chaves do local. O rastreamento das ligações de Baiano mostra que pouco antes da reunião, entre 18h48 e 19h20, ele fez oito contatos via rádio – vinculado à empresa Hawk Eyes, de sua propriedade – com o proprietário do escritório.
Entre 19h e 21h, o lobista do PMDB fez outros três contatos pelo celular com um número cadastrado em nome de Weyne e Costa Advogados. As ligações foram captadas por antena de transmissão instalada na Avenida Ataulfo de Paiva. A Procuradoria sustenta que Baiano fez os contatos para avisar o dono do escritório que iria ocupar o imóvel naquele domingo.
A Procuradoria constatou que Eduardo Cunha, de fato, estava no Rio naquele fim de semana. Em consulta à cota para exercício de atividade parlamentar do peemedebista, no Portal da Câmara, obteve-se a informação que ele voou para o Rio.
No dia da reunião, o delator Júlio Camargo voou de Congonhas, São Paulo, para Santos Dumont, no Rio, às 17h30 – retornou para São Paulo às 21h. O motorista do delator, João Luiz Cavalheiro, confirmou que pegou Júlio Camargo no aeroporto e o levou em uma Toyota Camry preto, placas ELL-2211, até a esquina das avenidas Ataulfo de Paiva com Afrânio de Mello Franco. Aguardou por cerca de uma hora e meia e, depois, levou Júlio Camargo de volta ao aeroporto.
A Procuradoria afirma que Baiano e o deputado chegaram ao Leblon em uma Range Rover, placas EIV-8877. Devido à ausência de garagem no Leblon Empresarial, alguns condôminos alugam vagas do estacionamento mensal do prédio vizinho, Rio Design Leblon, com acesso pela Avenida Afrânio de Mello Franco.
O estacionamento confirmou aos investigadores a entrada no dia 18 de setembro de 2011, no horário da reunião da propina, da Range Rover, que está em nome da empresa Technis, de Fernando Baiano.
Segundo a Procuradoria, iniciada a reunião, Eduardo Cunha solicitou a Júlio Camargo o “pagamento da vantagem indevida”. Cunha disse, segundo o delator. “Júlio, em primeiro lugar eu quero dizer que não é nenhum problema pessoal em relação a você. Acontece que o Fernando não me paga porque diz que você não o paga. Como o Fernando não tem capacidade de me pagar, eu preciso que você me pague.”
A denúncia da Procuradoria contra Eduardo Cunha diz que o delator tentou se justificar, mas o deputado “foi irredutível”. “Eu não sei da história e nem quero saber”, teria dito Eduardo Cunha. “Eu tenho um valor a receber do Fernando Soares e que ele atrelou a você.”
A denúncia afirma. “Então, Eduardo Cunha solicitou expressamente a quantia de cinco milhões de dólares faltantes.” Nas palavras do delator, o presidente da Câmara disse. “Eu ainda tenho a receber 5 milhões de dólares em relação a este pacote.”
“Em vista da pressão ficou estipulado que Júlio Camargo pagaria US$ 10 milhões, sendo US$ 5 milhões para Eduardo Cunha e US$ 5 milhões para Fernando Soares, o que foi aceito”, diz a denúncia do procurador-geral da República Rodrigo Janot. “Eduardo Cunha, no entanto, solicitou a Júlio Camargo que tivesse preferência no recebimento do pagamento, pois tinha urgência.”
A Procuradoria afirma que Júlio Camargo se valeu do auxílio do doleiro Alberto Youssef para operacionalizar o pagamento de parte da propina, “mediante formas de ocultação e dissimulação”.
Fernando Baiano foi condenado a 16 anos de prisão na Justiça Federal do Paraná. Como não detém foro privilegiado perante o Supremo Tribunal Federal, ele foi processado na 1ª instância. Na segunda-feira, 17, o juiz Sérgio Moro condenou Baiano e o ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró por corrupção e lavagem de dinheiro.
Defesa
Em nota, Eduardo Cunha disse que está absolutamente sereno e refutou “as ilações” das denúncias apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF).