Aconteceu o que era esperado entre os membros do Ministério Público Federal. O atual procurador-geral da República, Rodrigo Janot, condutor das investigações da operação Lava Jato sobre políticos com cargos públicos, foi o mais votado entre os quatro procuradores que se candidataram para o cargo que ele ocupa. Agora, ele encabeça a lista tríplice que será enviada à Presidência da República para definir quem será o novo procurador-geral a partir de setembro, quando acaba o atual mandato dele. A tendência é que ele seja reconduzido à função, mas primeiro ele terá de passar por um teste: ser chancelado pelo Senado, onde está uma dezena de parlamentares alvo do escândalo de corrupção.
Janot teve uma vitória folgada, com o apoio de 799 dos 983 votantes na eleição promovida pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), em que cada procurador poderia escolher até três nomes para compor a lista tríplice. Farão parte da lista ainda os procuradores Mario Bonsaglia (462 votos) e Raquel Dodge (402 votos). Quem ficou de fora foi Carlos Frederico Santos, que teve 217 votos.
Como teve votos de 81% dos eleitores, o atual procurador sai ainda mais fortalecido e demonstra um forte apoio da classe à operação Lava Jato, que descobriu um esquema de desvio bilionário da Petrobras e em empresas do setor elétrico. Assim que o escândalo estourou, há pouco mais de um ano, Janot montou duas equipes de especialistas para dar suporte à investigação coordenada pela Procuradoria da República no Paraná.
Em primeira instância, são nove procuradores que investigam mais de 70 pessoas entre ex-deputados, ex-ministros, lobistas, doleiros, ex-diretores da Petrobras e da Eletronuclear, além dos principais empreiteiros do país. Já em Brasília, há outros sete procuradores, além do próprio Janot, responsáveis por investigar o núcleo político, que envolve parlamentares, governadores e outras autoridades com foro privilegiado. Neste caso, eles atuam nos processos que estão sendo abertos no Supremo Tribunal Federal (STF). Ente os investigados nessa instância estão o senador e ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL) e os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Desde março, quando denunciou formalmente ao Supremo Tribunal Federal dezenas de políticos acusados de participação no escândalo, Janot dividiu os holofotes da Lava Jato com a força-tarefa de procuradores do Paraná e o juiz Sergio Moro – o responsável por mandar para a cadeia donos de empreiteiras como Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez e, mais recentemente, o ex-ministro José Dirceu.
A Lista de Janot, a relação de 49 políticos de seis partidos implicados no escândalo, marca um ineditismo: foi a primeira vez em que tantas autoridades com foro privilegiado se tornaram alvo de uma mesma apuração, vencendo o marco anterior, o mensalão, julgado em 2012.
Por apontar sua mira para importantes nomes da política nacional, Janot ganhou uma série de “inimigos”. Os principais deles são Collor e Cunha. O primeiro, que já teve bens apreendidos e é suspeito de ter recebido 26 milhões de reais em propinas, pediu uma investigação contra Janot para que ele fosse destituído da função. O segundo chama de “querela pessoal” as acusações contra ele —entre elas, a de ter recebido ao menos 5 milhões de reais em pagamentos ilícitos.
Teste de fogo no Senado
Janot espera agora a decisão de Rousseff, que é quem indica o procurador-geral ao Senado. Nos Governos petistas, praxe tem sido escolher o mais votado e, conforme lideranças governistas, é isso o que deve ocorrer até setembro. “Se até reitores são escolhidos os mais votados, qual seria a lógica do procurador-geral ser diferente”, disse o líder do Governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS).
O principal problema para Janot é que parte de seus investigados o esperam no Senado e preparam um limbo jurídico para constrangê-lo. A estratégia é protelar o máximo possível a votação da indicação de Rousseff. Assim, a Procuradoria-Geral da República ficaria sob o comando do vice-presidente do Conselho Superior do Ministério Público, Eitel Santiago Pereira. Para membros do MPF, porém, esse castigo não teria efeito imediato, já que a estrutura montada para assessorar as apurações da Lava Jato seria mantida, independentemente de quem estiver no comando da instituição.
Caso ocorra algo improvável e a presidenta indique um dos outros dois nomes da lista tríplice, a Procuradoria Geral da República ficaria entre um ativo procurador que já comprou briga com a PF pelo direito de investigar, Mario Bonsaglia, e uma que ficou marcada pela operação que terminou com um governador do Distrito Federal cassado, Raquel Dodge.