O Supremo Tribunal Federal (STF) irá decidir se é constitucional a proibição de certos tipos de tatuagens a candidatos a cargo público contida em leis e editais de concurso público. A questão será analisada no Recurso Extraordinário (RE) 898450, interposto por um candidato ao cargo de soldado da Polícia Militar de São Paulo contra acórdão do Tribunal de Justiça local (TJ-SP) que reformou decisão de primeira instância e manteve sua desclassificação do concurso. O RE, de relatoria do ministro Luiz Fux, teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual e irá definir se o fato de uma pessoa possuir determinado tipo de tatuagem seria circunstância idônea e proporcional a impedi-lo de ingressar em cargo, emprego ou função pública.
No caso dos autos, o candidato obteve, em primeira instância, decisão favorável em mandado de segurança impetrado contra sua exclusão do concurso público para o preenchimento de vagas de soldado de 2ª classe depois que, em exame médico, foi constatado que possui uma tatuagem em sua perna direita que estaria em desacordo com as normas do edital. O Estado recorreu alegando que o edital estabeleceu, de forma objetiva, parâmetros para admissão de tatuagens, mas que o candidato não se enquadrava nessas normas.
Em acórdão, o TJ-SP destacou que o edital é a lei do concurso e a restrição em relação à tatuagem encontra-se expressamente prevista. Assim, ao se inscreveram no processo seletivo, os candidatos teriam aceitado as regras. O acórdão salienta que, quem faz tatuagem tem ciência de que estará sujeito a esse tipo de limitações. Acrescenta que a disciplina militar engloba também o respeito às regras e o descumprimento da proibição a tatuagens não seria um bom início na carreira.
Manifestação
Em manifestação quanto à repercussão geral, o ministro Luiz Fux observou que o STF já possui jurisprudência no sentido de que todo requisito que restrinja o acesso a cargos públicos deve estar contido em lei, e não apenas em editais de concurso público. Contudo, explica o ministro, o tema em análise é distinto, pois embora haja previsão legal no âmbito estadual dispondo sobre os requisitos para ingresso na Polícia Militar, a proibição é específica para determinados tipos de tatuagens. No entendimento do relator, essa circunstância atrai a competência do Supremo para decidir sobre a constitucionalidade da referida vedação, ainda que eventualmente fundada em lei.
“No momento em que a restrição a determinados tipos de tatuagens obsta o direito de um candidato de concorrer a um cargo, emprego ou função pública, ressoa imprescindível a intervenção do Supremo Tribunal Federal para apurar se o discrímen encontra amparo constitucional. Essa matéria é de inequívoca estatura constitucional”, salienta o ministro Fux.
O relator enfatiza que o artigo 37 da Constituição Federal (incisos I e II) estabelece que o provimento de cargos públicos efetivos depende de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos e se dará nos termos de lei. Entretanto, pontuou, um alegação genérica de que o edital é a lei do concurso não pode, em hipótese alguma, implicar ofensa ao texto constitucional, especialmente quando esta exigência não se revelar proporcional quando comparada com as atribuições a serem desempenhadas no cargo a ser provido. Segundo ele, é preciso definir se o fato de um cidadão ostentar tatuagens seria circunstância idônea e proporcional a impedi-lo de concorrer a um cargo público.
“A meu juízo, o recurso veicula matéria constitucional e merece ter reconhecida a repercussão geral, haja vista que o tema constitucional versado nestes autos é relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, e ultrapassa os interesses subjetivos da causa, mormente diante da constatação da existência de leis e editais disciplinando a restrição de candidatura a cargos, empregos e funções quando se está diante de tatuagem fora dos padrões aceitáveis pelo Estado”.
Por maioria, o Plenário Virtual da Corte reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional levantada. Ficaram vencidos os ministros Teori Zavascki, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.