O jornal Le Monde desta sexta-feira (4) traz uma nova reportagem sobre a crise política no Brasil. A publicação francesa relata que os vazamentos quase diários de denúncias contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva “demolem, pouco a pouco, a herança do ex-ídolo das classes populares do Brasil”.
Com o título “Lula tenta salvar a sua pele e o Brasil”, a matéria se inicia com uma visita a Atibaia, onde fica o luxuoso sítio frequentado pelo ex-presidente, alvo de suspeitas de irregularidades por ter sido reformado pela empreiteira Odebrecht, no coração dos escândalos de corrupção na Petrobras. No trajeto, a correspondente do jornal se depara com pichações como “Lula na cadeia” ou “sítio de Lula bandido”.
“Reais ou fantasiosos, anedóticos ou constrangedores, esses casos demonstram que Lula, que deixou o poder endeusado, com uma popularidade de 80%, não é mais intocável”, afirma o texto.
A reportagem ressalta que a imprensa brasileira acompanha cada passo das investigações, em busca de “indícios que poderiam comprometer o ex-sindicalista”, e repercute as últimas denúncias publicadas pela revista IstoÉ, sobre a suposta delação do senador Delcídio Amaral. Os depoimentos do ex-líder do governo no Senado teriam atingido “gravemente” Lula e a presidente Dilma Rousseff, explica o Monde.
De indiferente, Lula passou a se irritar com denúncias
O jornal observa que, inicialmente, Lula optou por uma “indiferença misturada com desprezo” em relação às denúncias envolvendo o seu nome, mas, agora, o líder político “se enraivece”. Por isso, o ex-presidente se previne do risco de ser atingido pela Lava Jato – interpôs na Justiça de São Paulo um pedido de habeas corpus preventivo e deve lançar um site para listar as denúncias publicadas pela imprensa e que, segundo ele, seriam infundadas.
Por conta dos últimos acontecimentos, “a raiva de Lula trai as ambições do político” de, talvez, voltar a se candidatar à presidência, diz Le Monde. “Seu discurso, seu carisma e seu pragmatismo fazem dele ‘o’ candidato do PT”, indica o jornal, antes de notar que uma pesquisa do Datafolha publicada em fevereiro mostrou que Lula reuniria 20% dos votos, atrás de Aécio Neves, com 24%, mas à frente de Marina Silva, com 19%. O analista Cristiano Noronha, ouvido pelo diário francês, afirma que “Lula não é mais invencível, mas não está morto”.
Alternativa seria se afastar de Dilma, uma opção arriscada
Stéphane Monclair, professor da Sorbonne e especialista na política brasileira, acrescenta que, para seduzir “os nostálgicos dos anos de bonança”, Lula teria de “se afastar de Dilma” – e contar com a certeza de “não ser pego pela Justiça”.
O jornal então conclui que este é o “dilema” do ex-presidente: “matar a sua filha”, a sua escolhida para sucedê-lo no poder, mas que hoje “é detestada pela maioria dos brasileiros, encarna a crise, o desemprego e a inflação”. A reportagem afirma que, para completar, Dilma ainda provocou o descontentamento da militância do PT ao “trair” o partido para “obedecer aos mercados, com uma política de austeridade”.
O divórcio de Dilma, no entanto, é perigoso, já que os dois pertencem ao mesmo partido e, por isso, Lula “só pode defendê-la” diante dos ataques. “Além disso, se afastar dela não seria suficiente para fazer esquecer os múltiplos escândalos que despencam sobre ele o partido”, sem contar que ele precisaria trazer ideias novas para enfrentar a crise – mas “Lula parece estar sem argumentos, tanto para o país quanto para se defender”, frisa Le Monde.
MSN Brasil