A 24ª fase da Operação Lava Jato investiga a relação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seus familiares com empreiteiras envolvidas no esquema de corrupção da Petrobras. O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF) encontraram indícios de que Lula recebeu vantagens indevidas, como um apartamento e reformas em imóveis, além de doações e pagamentos por palestras via Instituto Lula e a empresa LILS Palestras, que pertence ao ex-presidente.
O MPF diz que o instituto recebeu de empreiteiras R$ 20 milhões em doações e que a LILS Palestras recebeu R$ 10 milhões. Investigadores querem saber se os recursos vieram de desvios da Petrobras e se foram usados de forma lícita. Parte do dinheiro foi transferido do Instituto Lula para empresas de filhos do ex-presidente, e o MPF apura se serviços foram de fato prestados.
Entenda as suspeitas contra Lula
“São realmente, que nós sabemos, [empresas] que caracterizavam o núcleo duro do cartel que dilapidou o patrimônio da Petrobras. Isso deve ser investigado com o aprofundamento das investigações”, disse o procurador Carlos Fernandes Santos Lima, em entrevista coletiva em Curitiba, nesta sexta-feira (4).
“Os favores são muitos e são difíceis de quantificar”, disse ele, sobre relação do ex-presidente com as empreiteiras. “Não há nenhuma conclusão no momento, mas os indicativos eram suficientes.”
O Instituto Lula nega envolvimento do ex-presidente em irregularidades apuradas na Lava Jato e diz que ele nunca cometeu qualquer ilegalidade (confira nota ao final do texto).
A defesa de Lula pediu à Justiça a suspensão da nova fase da Lava Jato, que foi batizada de “Aletheia” (busca da verdade).
RESUMO DA COLETIVA
O MPF e a PF citaram, em entrevista em Curitiba, as suspeitas sobre o ex-presidente:
– 47% dos recursos recebidos pela LILS Palestras, entre 2011 e 2014, vieram de empreiteiras envolvidas na Lava Jato: Camargo Corrêa, Odebrecht, UTC, OAS, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez.
– 60% dos recursos do Instituto Lula vieram das mesmas empresas.
– A LILS Palestras e o Instituto Lula, que tem isenção fiscal, tinham uma “confusão operacional”.
– Cerca de R$ 1 milhão foi transferido do Instituto Lula para a G4, empresa de um dos filhos do ex-presidente, Fábio Luís. A PF apura se serviços foram prestados.
– Da OAS, Lula teria recebido um triplex no Guarujá, além de reforma e móveis de luxo no valor de R$ 1 milhão;
– Ele teria comprado dois sítios em Atibaia, em nome de terceiros, no valor de R$ 1,5 milhão;
– Crimes investigados na Lava Jato enriqueceram PT, PMDB e PP e financiaram campanhas eleitorais.
– A OAS teria pagado R$ 1,3 milhão para guardar itens retirados do Palácio Planalto quando Lula terminou o mandato;
– MPF apura se o ex-presidente sabia do esquema de desvio de recursos da petrolífera e se foi beneficiado por ele;
DEPOIMENTO DE LULA
Foi expedido um mandado de condução coercitiva (em que alguém é levado à força para depor) contra o ex-presidente. Ele foi ouvido por mais de três horas no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo e, em seguida, foi para o diretório do PT na capital. O procurador afirmou que não quis marcar um depoimento com antecedência para evitar manifestações.
“Era necessário ouvi-lo. O MPF tem uma investigação, necessitava ouvir o ex-presidente. Não havia como não fazer a oitiva. Se tivéssemos marcado com antecedência, teríamos um risco maior de segurança”, disse Santos Lima.
O delegado Igor Romário de Paula afirmou que, provavelmente, o depoimento de Lula foi o mais longo de todas as conduções coercitivas cumpridas na Lava Jato. O depoimento começou às 8h e terminou perto das 11h40.
Nesta sexta, três locais onde a PF cumpria mandados de busca e apreensão foram alvo de protestos: o Instituto Lula, a casa do ex-presidente, em São Bernardo do Campo, e no aeroporto de Congonhas. Manifestantes pró e a anti-Lula chegaram a se enfrentar em alguns momentos.
A 24ª fase cumpre 44 mandados judiciais, sendo 33 de busca e apreensão e 11 de condução coercitiva. Duzentos policiais federais participam da operação.
Em São Paulo, a ação ocorre na capital, em São Bernardo do Campo, Atibaia, Guarujá, Diadema, Santo André e Manduri. Agentes também cumprem mandados no Rio de Janeiro e em Salvador.
VAZAMENTOS
O procurador Carlos Fernandes Santos Lima afirmou que vazamentos estão atrapalhando investigações da força-tarefa da Lava Jato: “Provas são destruídas. […] Infelizmente, verificamos que houve vazamento e houve prejuízo da atuação da Polícia Federal. Vamos apurar.”
O MPF avaliou que não há pressupostos para pedir a prisão do ex-presidente. “Nesse momento, as investigações não são conclusivas ao ponto de pedir a prisão.”
Segundo o procurador, a Operação Lava Jato não tem “nenhuma motivação política”. “Nós não temos nenhuma, nenhuma, repito, motivação política. A questão, então, portanto, de hoje foi apenas mais uma etapa da Operação Lava Jato. Outras se seguirão, certamente”. “Somos republicanos: não há ninguém isento de ser investigado no país. Lula não tem foro privilegiado.”
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
O procurador afirmou que a Lava Jato investiga uma organização criminosa infiltrada no governo federal que se utilizava da Petrobras e outras empresas para financiamento político (veja no vídeo abaixo).
“Essa organização criminosa certamente possui um comando. Foi verificado que o ex-ministro José Dirceu fazia parte deste comando, junto com o ex-tesoureiro [João] Vaccari, entre outros. Entretanto, mesmo após a prisão do ex-ministro, a organização criminosa continuou a existir.”
“Hoje estamos analisando evidências de que o ex-presidente e sua família receberam vantagens para eventualmente consecução de atos no governo. Isso ainda é uma hipótese investigativa. Não há nenhuma motivação plausível para esse pagamento de vantagens”, disse Santos Lima.
Questionado, ele não respondeu se Lula integra o grupo, mas afirmou que o governo dele foi beneficiado. “O governo dele foi um dos beneficiados pela compra do apoio político e partidário. Estamos investigando”, afirmou.
DEFESA E NOTAS
A defesa do ex-presidente pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão de procedimentos relacionados às investigações relacionadas a ele dentro da Operação Lava Jato.
A peça diz que a condução coercitiva do ex-presidente é “desnecessária”. “O suscitante [Lula] já prestou um depoimento à Polícia Federal quando notificado a fazê-lo em inquérito policial que corre em Brasília, deste ano, conforme documento anexo. Portanto, não há nenhuma base para presumir que, regularmente notificado, não iria repetir um ato de cuja realização não relutara”, diz o pedido de suspensão.
Em nota, o Instituto Lula afirmou nesta sexta que a ação da Polícia Federal que realizou buscas na casa do ex-presidente e a condução coercitiva foi “arbitrária, ilegal e injustificável”.
G1