A universidade tem se tornado um ambiente cada dia mais hostil às mulheres, vítimas de violências e abusos diários. Desde semana passada, pelo menos três casos de abusos sexuais foram registrados pelo Fórum de Mulheres da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), coletivo formado por estudantes, professoras e servidoras para cobrar maior investimento em políticas de proteção na maior instituição de ensino do Estado.
Nas redes sociais, universitárias espalham mensagens de denúncia, alertando às demais estudantes sobre o perigo do cotidiano de medo e violências. Os banheiros do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA) são as áreas que mais preocupam as alunas e professoras, já que poucos são fiscalizados pela segurança da instituição.
Em visita ao local, a reportagem encontrou apenas dois seguranças pelo corredor que liga CCHLA, Centro de Educação (CE) e Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA), complexos que, juntos, abrigam um dos maiores quantitativos de alunos de toda instituição. Os seguranças andavam um a lado do outro, diminuindo, assim, a abrangência da ronda.
Quem circula pela UFPB sente de perto a ausência de políticas de proteção. É o caso da universitária Laís Suassuna, de 23 anos. No 6º período de Jornalismo, ela evita andar desacompanhada em determinados horários. “À noite só vou para casa quando meu pai vem me buscar, porque o caminho para parada de ônibus é escuro e esquisito. A gente tenta andar em grupo, porque sabemos que estamos vulneráveis aqui”, disse.
Outra que traça estratégias de proteção é Luíza Araujo, de 20 anos. Também aluna do curso de Comunicação, ela sente medo de circular pela UFPB, principalmente quando chega o final da tarde. “Aqui não vemos seguranças. As lâmpadas vivem queimadas e os corredores escuros. Dizem que há câmeras de segurança, mas não sabemos se funcionam”.
Amanda Carvalho, 28 anos, estuda Biologia e sente falta de políticas de prevenção à segurança das alunas e professoras. “Eles estão instalando câmeras, mas até onde sei câmera não previne abuso sexual. No máximo ela pode identificar um agressor, mas só depois que eu ou uma amiga estivermos violentadas. Eles precisam investir em prevenção e proteção”, destacou.
Relatos das vítimas
Militante do Fórum de Mulheres da UFPB, a professora e pesquisadora Margarete de Almeida Nepomuceno tem ouvido de perto os relatos das estudantes e professoras agredidas. “As alunas nos procuraram e estamos movimentando essas denúncias, que têm surgido o tempo inteiro. Soubemos de três casos só na Praça do CCHLA. Pedimos à administração universitária as imagens do circuito de segurança interna, para identificar os agressores”, disse.
Em um dos casos, a estudante contou a violência sofrida. “Uma delas foi estuprada, de acordo com aquilo que o código entende como estupro. O agressor pegou nela, apalpou seus seios, botou a mão por dento da sua calcinha, ameaçou de morte. É uma situação delicada, assustadora e que estamos tentando combater dentro da universidade”.
De acordo com a professora, pelos relatos recolhidos, existe mais de um agressor tentando abusar universitárias nos banheiros da UFPB. “Isso é ainda mais preocupante, porque mostra que a universidade é ‘terra sem lei’, qualquer um entra e faz o que quer. A direção do CCHLA já foi acionada e solicitamos, além das imagens das câmeras, mais segurança feminina na região. Mas a sensação é de medo e de selvageria”, destacou a professora Margarete Almeida Nepomuceno, do Fórum de Mulheres da UFPB.
A violência não se restringe aos banheiros. Em outros pontos da universidade, estudantes estão vulneráveis até mesmo quando se trancam em ambientes teoricamente seguros. Na noite do feriado da última terça-feira, um grupo de homens tentou arrombar a porta do Centro Acadêmico de Enfermagem, onde universitárias, que participavam do I Encontro Sobre Saúde Mental das Mulheres, estavam dormindo.
CCHLA quer oficialização
A diretora do CCHLA, Mônica Nóbrega, disse que está aguardando a oficialização do relato das universitárias abusadas. “Soubemos que foi uma aluna de Letras e outra de Biologia. Já solicitamos o reforço da segurança no nosso Centro e, quando recebermos os detalhes dos abusos, vamos investigar as imagens das câmeras, para identificar os agressores”. De acordo com a representante do CCHLA, a segurança ainda é uma questão frágil dentro da UFPB. “Uma lâmpada que queima, para ser trocada leva dias, por causa do pregão. Muitas vezes queimam rápido ou a instituição não compra lâmpadas suficientes. Se não comprarmos do nosso bolso os corredores ficam escuros por semanas. Já tem mais de três anos que discutimos essas questões tentando resolver isso com mais celeridade”, disse Mônica Nóbrega.
Posição
A Universidade, via assessoria de imprensa, disse que o posicionamento deveria ser da direção do CCHLA. “Em primeira instância essas ocorrências são respondidas pela direção de Centro. Não encontramos nenhuma evidência que houve mesmo (os abusos sexuais). No nível que a coisa está, de boato, de não saber se teve ou não teve, é direção de Centro quem responde”.
Correio da Paraíba