O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, nesta terça-feira (10), a audiência pública sobre o vínculo empregatício entre motoristas e entregadores de aplicativos e as respectivas plataformas digitais. A discussão, que ocorreu ao longo de duas sessões, abordou as implicações das relações de trabalho estabelecidas por meio dessas plataformas e se devem ser reconhecidas como vínculo empregatício. O caso, que envolve a Uber, foi apresentado no Recurso Extraordinário (RE 1446336) e foi reconhecido como de repercussão geral, ou seja, a decisão tomada pelo STF afetará todos os casos semelhantes que tramitam no Judiciário brasileiro.
A audiência, conduzida pelo relator do caso, ministro Edson Fachin, contou com a participação de 58 expositores, entre eles representantes de sindicatos, empresas, juristas, especialistas e entidades ligadas ao tema. Durante a sessão de terça-feira, o desembargador Francisco Ferreira Jorge Neto, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, argumentou que as normas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)possuem elementos suficientes para caracterizar a relação de trabalho entre motoristas e plataformas digitais, afirmando que “não há Uber sem motorista”. Para ele, a plataforma de transporte, embora digital, representa uma forma moderna de um serviço tradicional, mediada pela tecnologia.
A advogada Meilliane Pinheiro Vilar Lima, que representou a parte recorrida, defendeu que a relação entre motoristas e plataformas configura um vínculo de trabalho e destacou que o ordenamento jurídico brasileiro está preparado para oferecer a proteção necessária aos trabalhadores dessa categoria. Ela ressaltou que a Constituição de 1988 garante um nível mínimo de proteção para todos os trabalhadores, incluindo os autônomos, e que a Justiça Trabalhista possui competência para analisar e regular essas novas formas de trabalho.
O STF continuará com o processo de análise do caso.
Posição da Uber
A representante da Uber, Caroline Perônio Arioli, disse que a Uber é uma empresa de tecnologia, e defendeu que as obrigações de vínculo empregatício previstas na CLT não são aplicáveis, pois os motoristas possuem a liberdade para escolher quando e onde trabalhar. “Em algum momento de suas vidas, 5 milhões de brasileiros geram renda com o aplicativo. Isso equivale a R$ 140 bilhões que foram repassados pela plataforma aos motoristas nos últimos 10 anos no Brasil”, informou. Ainda segundo Caroline, a Uber propõe um aperfeiçoamento da regulação para priorizar a proteção previdenciária e social dos motoristas. Assim, seria possível dar continuidade à flexibilidade do modelo sem causar prejuízos em sua livre iniciativa e funcionamento.
Outras experiências
O pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Murilo Van der Laan, do departamento de Sociologia, destacou, durante intervenção na audiência pública no STF, que a experiência da União Europeia tem influenciado significativamente as discussões sobre o vínculo empregatício dos motoristas de aplicativos. Segundo Van der Laan, a jurisprudência da região tem rejeitado amplamente a classificação dos trabalhadores de plataformas como autônomos, uma postura que se reflete em uma diretiva voltada para a melhoria das condições trabalhistas nas plataformas digitais.
A análise do pesquisador apontou que, em países como Espanha, França, Suíça, Alemanha, Holanda, Itália, Reino Unido e Hungria, a tendência predominante nas decisões jurídicas é contrária à definição das plataformas sobre os trabalhadores como autônomos.